terça-feira, 24 de janeiro de 2012

Cruz do Patrão

Dentre os monumentos que mais me impressionam na cidade do Recife, está a Cruz do Patrão. Esse assombro deriva de duas razões: A primeira advém das suas histórias: outrora fora cemitério de escravos e lugar para a realização de magia. A segunda, deriva do estado de completo abandono do local, que se encontra em um matagal espremido entre os armazéns açucareiros do Porto do Recife e o Rio Beberibe.



Conta-se que no passado, o local fora utilizado como cemitério de escravos. Um relato impressionante sobre o fato foi encontrado nos diários de viagem de certa inglesa chamada Maria  Grahan no século XIX:

“O sol já ia baixo muito antes de termos alcançado sequer o primeiro dos dois  fortes  (Buraco  e  Brum,  respectivamente)  em  nosso  caminho  de  volta  para  a  cidade.  Os  cães  já  haviam  começado  uma  tarefa  abominável.  Eu  vi  um  que arrastava o braço de um negro de sob algumas polegadas de areia, que o senhor  havia feito atirar sobre os seus restos. É nesta praia que a medida dos insultos  dispensados aos pobres negros atinge o máximo. Quando um negro morre, seus companheiros colocam­no numa tábua, carregam­no para a praia onde abaixo  do  nível  da  preamar  eles  espalham  um  pouco  de  areia  sobre  ele. Mas  a  um  negro  novo  até  este  sinal  de  humanidade  se  nega.  É  amarrado  a  um  pau,  carregado à noite e atirado à praia, de onde talvez a maré o possa levar”.[1]

Apesar de escavações arqueológicas não confirmarem a veracidade do fato[2], é sabido que locais ermos eram utilizados para o abandono de cadáveres de escravos que eram descartados como peças.

Dentre outros episódios destaca-se o descrito por Gilberto Freyre onde afirma que:

“[...] os negros se reuniam para fazer catimbó e que certa vez apareceu o diabo, pegou uma "negra de toutiço gordo e sumiu com ela no meio d´água. Tudo isso, entre estouros e no meio de muita catinga de enxofre".[3]

Existem, contudo muitas evidências, oriundas das escavações, de que o local era realmente utilizado para práticas religiosas Afro-brasileiras.[4]


Mesmo diante da riqueza e do valor simbólico para as comunidades Afro-descendentes do nordeste, a Cruz do patrão está abandonada. Existem diversos projetos de revitalização, entretanto nenhum foi ainda realizado.


[1] RAMOS, Ana Catarina Torres. Além dos mortos da Cruz do Patrão ­ simbolismo e tr adição no uso do  espaço no Recife. Disponível em: <http://www.ufpe.br/clioarq/images/documentos/V23N2-2008/artigo3.pdf>  Acesso em: 24 jan. 2012. p.6-7.

[2]  RAMOS, Ana Catarina Torres. Além dos mortos da Cruz do Patrão ­ simbolismo e tr adição no uso do  espaço no Recife. Disponível em: <http://www.ufpe.br/clioarq/images/documentos/V23N2-2008/artigo3.pdf>  Acesso em: 24 jan. 2012. p. 6

[3] GASPAR, Lúcia. Cruz do Patrão. Pesquisa Escolar Online, Fundação Joaquim Nabuco, Recife. Disponível em: <http://basilio.fundaj.gov.br/pesquisaescolar/>. Acesso em: 24 jan. 2012.

[4]  RAMOS, Ana Catarina Torres. Além dos mortos da Cruz do Patrão ­ simbolismo e tr adição no uso do  espaço no Recife. Disponível em: <http://www.ufpe.br/clioarq/images/documentos/V23N2-2008/artigo3.pdf>  Acesso em: 24 jan. 2012. p. 5

Série Museu da Abolição. Recife-PE